Pôr freios à Suprema Corte

(o Congresso precisa reagir à invasão de sua competência pelo STF)

Supremo Tribunal Federal

Se o Legislativo não legisla, pode o Judiciário legislar em seu lugar? Não. Os juízes, que não receberam mandato popular, não têm legitimidade para criar leis.

Há casos em que o Congresso Nacional se omite em legislar. Por exemplo: segundo a Constituição Federal, “compete à lei federal estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221” (art. 220, § 3º, II, CF), ou seja, que contrariem o “respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família” (art. 221, IV, CF). Essa “lei federal” não foi feita até hoje. Como consequência, a pornografia circula livremente em nossos meios de comunicação. Poderia o Supremo Tribunal Federal criar essa lei? Não.

Mesmo quando declara a existência de inconstitucionalidade por omissão, a Suprema Corte não pode criar a norma que falta. Em tal caso “será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias” (art. 103, § 2º, CF).

Há outros casos, porém, em que o Congresso não se omite em legislar. Já legislou e recusa-se a mudar a legislação. É o caso do aborto, totalmente proibido por nossa legislação, apesar de o governo federal ter insistido em sua liberação através do Projeto de Lei 1135/91. Tal proposição foi derrotada por 33 votos contra zero na Comissão de Seguridade Social e Família em 07/05/2008 e por 57 votos contra 4 na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) em 09/07/2008. Se o Congresso não quer aprovar o aborto em nenhum caso, nem sequer em caso de más-formações graves como a anencefalia, não se pode falar em “omissão”. Os abortistas derrotados podem lamentar que o Congresso tenha legislado de modo oposto à vontade deles. Mas não podem dizer que ele deixou de legislar.

Do mesmo modo, se há anos o Congresso se obstina em não querer aprovar a “união estável” de pessoas do mesmo sexo, proibida, aliás, pela Constituição, não se pode dizer que ele tenha sido “omisso”. O Congresso legislou, mas de modo contrário à vontade dos homossexualistas.

Os fautores da cultura da morte – quando se deparam com um obstáculo intransponível no Poder Legislativo – acusam-no de estar-se “omitindo” e pedem socorro ao Judiciário. O que é mais lamentável é que a Suprema Corte vem cometendo reiteradamente dois erros: a) chamar de “omissão” a uma decisão legislativa desfavorável a uma parte; b) atribuir a si o direito de suprir essa “omissão” alterando a lei para satisfazer a parte insatisfeita, ou seja, agindo como legislador positivo, o que constitui evidente invasão de competência.

Segundo o jurista Ives Gandra da Silva Martins, isso vem acontecendo a partir da ascensão do Partido dos Trabalhadores ao poder, ou seja, nos governos Lula-Dilma:

Ora, a Suprema Corte brasileira, constituída no passado e no presente, por ínclitos juristas, parece hoje exercer um protagonismo político, que entendo contrariar o artigo 103, § 2º da CF que o impede de legislar.

Assim é que, a partir dos 9 anos da gestão Lula-Dilma, o Pretório Excelso passou a gerar normas, como nos casos de empossar candidato derrotado – e não eleito direta ou indiretamente – quando de cassação de governantes estaduais (art. 81 da CF), da fidelidade partidária, que os constituintes colocaram como faculdade dos partidos (art. 17 § 1º); do aviso prévio (art. 7º, inc. XXII); da relação entre homossexuais (art. 226 § 3º), do aborto dos anencéfalos (art. 128 do C. Penal), para citar apenas alguns[1].

O Ministro Ricardo Lewandowski já apontava esse fato em 29/05/2008 durante o julgamento da ADI 3510 (embriões humanos):

Esta Corte tem estabelecido condicionantes quase que adentrando no campo do legislador, por exemplo, no caso da Lei de Greve no serviço público e da fidelidade partidária. Nós estamos em uma nova fase histórica no STF, em que essa Casa assume um novo protagonismo[2].

Na frase acima o “quase que” poderia ser suprimido. Já naquela época, o STF estava de fato adentrando no campo do legislador. O Ministro Gilmar Mendes, porém, considerava isso algo positivo. Segundo ele, era possível antever

que o Supremo Tribunal Federal acabe por se livrar do vetusto dogma do legislador negativo e se alie à mais progressiva linha jurisprudencial das decisões interpretativas com eficácia aditiva, já adotadas pelas principais Cortes Constitucionais européias[3].

O que Gilmar Mendes via (e ainda vê) como um progresso na verdade é um grande retrocesso. O Brasil ingressou numa era de insegurança jurídica, em que o único limite para as decisões da Suprema Corte é o da imaginação de seus Ministros, todos eles nomeados pelo Presidente da República, e nenhum deles eleito pelo povo.

Submissão do Congresso

Há congressistas que se submetem ao Supremo Tribunal Federal como se ele detivesse um “supremo poder”, capaz de dar ordens ao Legislativo. Há até aqueles, como os da bancada governista, que agradecem à Suprema Corte por ter “legalizado” a união estável de homossexuais e o aborto de anencéfalos, poupando-os do ônus de votar a favor de tais aberrações no Congresso Nacional.

Em 17/05/2012, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) aprovou por unanimidade o Projeto de Lei do Senado (PLS) 50/2011, de autoria do Senador Mozarildo Cavalcanti (PTB/RR), que acrescenta um inciso III ao artigo 128 do Código Penal a fim de não punir o aborto de anencéfalos “legalizado” pelo STF. O projeto foi agora encaminhado à Comissão de Assuntos Sociais (CAS), tendo como relator o senador Paulo Davim (PV/RN).

Não é só. Em 24/05/2012 a mesma Comissão de Direitos Humanos aprovou o Projeto de Lei do Senado (PLS) 612/2011, da senadora Marta Suplicy (PT/SP), que “altera os arts. 1.723 e 1.726 do Código Civil, para permitir o reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo”. A “união estável” de homossexuais, arbitrariamente imposta pelo STF a partir de uma suposta “interpretação conforme a Constituição”, foi acolhida com passividade pelos membros da CDH. A proposta, que inclusive reconhece a conversão de tal união em “casamento”, agora segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC), tendo como relator o senador Roberto Requião (PMDB/PR). Se for aprovada lá e não houver recurso para exame no plenário, poderá ir diretamente para a Câmara.

Reação do Congresso

No dia 11/04/2012, o presidente do Senado José Sarney recebeu da bancada católica e evangélica o pedido de “impeachment” do Ministro Marco Aurélio[4] por “proceder de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro de suas funções” (art. 39, n. 5, Lei 1079/1959) confessando seu interesse em usar a ADPF 54 como “gancho” para a liberação do aborto. Até agora não se tem notícia de uma comissão especial de senadores para decidir o assunto, conforme prevê a lei.

Em 9/05/2012, o deputado Marco Feliciano (PSC/SP) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo 565/2012, que “susta a aplicação da decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54, que declara não ser crime a ‘antecipação terapêutica de parto’ de anencéfalos”. Como era de se esperar, em 29/05/2012 o presidente da Câmara, Marco Maia (PT/RS), devolveu o projeto ao autor por considerá-lo “evidentemente inconstitucional”[5]. Cabe ao autor recorrer ao plenário no prazo de cinco sessões legislativas[6].

Uma solução cabal do assunto requererá, porém, duas emendas constitucionais. Uma delas que inclua no caput do artigo 5º da Constituição Federal as sagradas palavras “desde a concepção” logo após “inviolabilidade do direito à vida”. Outra que acrescente ao artigo 102 um parágrafo quarto, que explicite: “É vedado ao Supremo Tribunal Federal atuar como legislador positivo, sendo nulas as decisões interpretativas com eficácia aditiva”.

Além disso, será preciso instruir os eleitores a negarem seu voto aos candidatos do Partido dos Trabalhadores. Enquanto esse partido estiver na Presidência da República, será ele que nomeará os ministros do STF. E por meio dessa Corte imporá ao povo brasileiro sua agenda antivida e antifamília.

Anápolis, 11 de junho de 2012.

Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz



[1] Ives Gandra da Silva MARTINS, Os dois Supremos, Folha de S. Paulo, 25 maio 2012.

[2] O grifo não é do original.

[3] Voto na ADI 3510, 29 maio 2008, p. 35.

[5] Art. 137, § 1º, II, a, Regimento Interno da Câmara dos Deputados.

[6] Em 10/05/2012, os deputados Roberto de Lucena (PV/SP), Salvador Zimbaldi (PDT/SP) e João Campos (PSDB/GO) apresentaram o Projeto de Decreto Legislativo 566/2012, de idêntico teor. Também este foi devolvido aos autores em 29/05/2012 com a mesma alegação. Cabe recurso ao plenário em igual prazo.

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