Dez perguntas sobre o DIU

(o especialista Dr. Bussamara Neme esclarece o efeito abortivo do dispositivo intra-uterino)

São Paulo, 22 de junho de 1998.CuT380
Exmo. Sr.
Padre Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis
Prezado Senhor:
Em atenção à sua solicitação, estou respondendo aos quesitos que me foram feitos.

PERGUNTA 1: O que leva o senhor a crer que o mecanismo de ação do DIU seja abortivo ?
RESPOSTA: De todos os métodos abortivos o mais seguro é aquele que introduz um corpo estranho na cavidade uterina. Como corpo estranho o DIU aumenta a contratilidade uterina no sentido de provocar sua expulsão. 
Sabemos que na segunda fase do ciclo menstrual (também chamada pós-ovulatória) o organismo da mulher, quando ocorre a fecundação, é invadido pelo hormônio progesterona, secretado pelo corpo lúteo. Este hormônio inibe a contratilidade uterina, mantendo o útero quiescente. 
O óvulo fecundado, agora ovo, normalmente, migra pela luz tubária durante três dias e ao atingir a cavidade uterina não apresenta, ainda, a capacidade corrosiva (da sua superfície externa ou trofoblastro) necessária para sua implantação na decídua materna. Assim, permanece livre por cerca de 3 a 4 dias, até atingir no sétimo dia, a capacidade corrosiva indispensável para a sua nidação. A quiescência uterina, prodigalizada pela progesterona, é indispensável para evitar a contratilidade uterina que, fatalmente, eliminaria o ovo (ainda não fixado no útero).
A presença do DIU, mantendo contratilidade uterina permanente é anormal e a irritação de secreções anormais da decídua (onde deve ocorrer a implantação), favorecem a expulsão do ovo, até então livre na cavidade uterina. Trata- se de um micro-abortamento que ocorre assintomático (em geral).


PERGUNTA 2: Há médicos que dizem que pelo menos o DIU de cobre, como o TCu 380A, não causa aborto, mas mata ou imobiliza os espermatozóides antes da fertilização. O que o senhor tem a dizer?
RESPOSTA: As entidades defensoras do emprego do DIU, não encontrando justificativa fisiológica contra a idéia de que a presença do DIU impede a nidação, apelaram para o emprego de DIU acrescidos de cobre. Esse metal, durante 2 anos (idéia inicial), teria capacidade espermatecida, impeditiva da fecundação. 
Sou testemunha de várias clientes, portadoras de DIU de cobre há mais de 6 anos e, entretanto, apesar de anulada a ação espermatecida, permanecem mantendo vida sexual normal sem que ocorram gestações.


PERGUNTA 3: O senhor acha verossímil que um artefato de plástico consiga deter uma marcha de 200 milhões de espermatozóides, ou acredita que o principal mecanismo de ação do DIU é impedir a nidação da criança no útero ?

RESPOSTA: Acredito, como referi na resposta l, que o DIU ao manter exagerada e anormal a contratilidade uterina e ao provocar a irritação da decídua, seja responsável pela expulsão do ovo, que ao chegar na cavidade uterina ainda não apresenta capacidade corrosiva para a sua implantação.


PERGUNTA 4: Em 1982 um grupo de pesquisadores australianos detectou a presença do EPF (early pregnancy factor) em 6 dos 23 ciclos menstruais de 14 mulheres usuárias de DIU. Esta presença não foi seguida pelo acréscimo do beta-HCG, indicando que houve concepção, mas não houve nidação. Ao contrário, não foi detectado EPF em mulheres que preveniam a fertilização pela abstinência sexual ou pela laqueadura tubária (Early Pregnancy Factor as a monitor for fertilization in women wearing intrauterine devices. Fertil. Steril. 1982 Feb;37(2):201-204). Esta pesquisa já estaria obsoleta ou seus resultados continuariam válidos para atestar o efeito abortivo do DIU ?

RESPOSTA: Na 16ª Edição do livro “Contraceptive Technology”, editado pela Irvington Publishers Inc. (New York) em 1994, os A.A. responsáveis pela sua autoria (em n° de 7), referem: “o exato mecanismo de ação anticonceptiva do DIU é completamente, desconhecido”. E duas opções são sugeridas: 
1. “imobilização dos espermatozóides e ou interferência na sua migração até atingir a trompa” (onde ocorre a fecundação). 
2. “apressar a migração ovular na trompa, fazendo com que o ovo atinja a cavidade uterina ainda não preparada para recebê-lo”.
Das duas propostas ações anticonceptivas, a primeira é descartada, pois com DIU simples ou acrescido de cobre, têm sido encontrados espermatozóides vivos na cavidade uterina e na trompa.
A segunda hipótese admitida pêlos AA. concorda, plenamente, com a fisiopatologia da migração e nidação ovular já referida nas respostas anteriores. 
No alentado “Manual de Reproducción Humana”, editado pela Federação Internacional das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) e pela Organización Panamericana de la Salud, em 1994, o mecanismo de ação do DIU é tratado discretamente. Entretanto há referências importantes como:
a) “Todos os DIUs estimulam reação de corpo estranho no endométrio”;
b) “Um grupo científico da Organização Mundial de Saúde (OMS) considerou ser improvável que um único mecanismo de ação seja provocado pelo DIU”.
Quanto à pesquisa relacionada a presença do EPF (Early Pregnancy Factor), até hoje ela não foi reformulada.


PERGUNTA 5: O DIU é muito usado como contraceptivo “pós-coital”, sendo inserido no útero vários dias após a relação sexual. Este fato atestaria que ele possui ação abortiva ? 
RESPOSTA: De acordo. Sempre pelo mecanismo que provoca sua expulsão pela hipercontratilidade uterina. As “curiosas” que provocam abortamentos precoces sabem muito bem que a presença de uma sonda intra-uterina, fatalmente, segue-se de abortamento.


PERGUNTA 6: O aborto causado pelo DIU poderia ser confundido com um sangramento menstrual sendo despercebido pela própria usuária ?.
RESPOSTA: Sim.


PERGUNTA 7: O fato de, em alguns casos, a criança conseguir aninhar-se no útero e desenvolver-se pode ser usado para negar que o DIU seja abortivo ? 
RESPOSTA: Não. Por vezes, particularmente em multigestas (mais de 5 gestações), a imperfeita implantação do DIU torna possível a nidação ovular.


PERGUNTA 8: A ausência de beta-HCG no sangue das usuárias de DIU pode ser um argumento válido para se negar o efeito abortivo do DIU? 
RESPOSTA: Não. Isso porque a presença de beta-HCG na circulação materna só ocorre após a nidação ovular manter trocas circulatórias entre a mãe e o ovo.


PERGUNTA 9: Que efeitos nocivos o DIU pode trazer à saúde da mulher?
RESPOSTA: A presença do DIU provoca maior perda hemorrágica menstrual (anemia) e altera a flora vaginal favorecendo infecções genitais.
Eventualmente, podem ocorrer: gestações ectópicas, perfuração uterina e infecções anexiais.


PERGUNTA 10: A que o senhor atribui que alguns médicos neguem categoricamente às suas pacientes que o DIU seja abortivo? 
RESPOSTA: Peço licença para não responder esta pergunta. Ela implica em questões éticas. Dentro das limitações que me proponho admito, até prova em contrário, que os colegas que defendem o emprego do DIU, desconhecem a fisiopatologia da fecundação, da migração e da nidação ovular.

PROF. DR. BUSSÂMARA NEME (CRMSP 3312)
Professor Emérito das Faculdades de Medicina
USP e UNICAMP
Professor Titular de Clínica Obstétrica
Faculdade de Medicina de Sorocaba (PUC)

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