Projeto quer considerar o aborto crime hediondo

Que o aborto é hediondo, é óbvio. A vítima é inocente, indefesa e os autores do crime são quem mais deveriam amá-la: seus progenitores (a mãe e o pai) e um profissional que jurou defender a vida: o médico. Em geral, os assassinos contentam-se em dar um tiro ou uma facada na vítima. Raramente encontramos homicídios em que a vítima seja esquartejada com requintes de crueldade. Se isso acontecer, trata-se de homicídio qualificado, que o art. 121 §2º inciso III do Código Penal pune com 12 a 30 anos de reclusão.

Em todo aborto, porém, a vítima é morta com extrema crueldade: ou ela é aspirada em pedacinhos (aborto por sucção) ou é esquartejada por duas lâminas afiadas chamadas curetas (aborto por curetagem) ou é envenenada por uma solução que corrói sua pele (aborto por envenenamento salino) ou simplesmente é retirada cirurgicamente do útero materno e atirada na lata de lixo mais próxima (aborto por cesariana).

Por estranho que pareça, porém, no Brasil as penas para o aborto são extremamente brandas. A mãe que mata o próprio filho no ventre não recebe mais do que 1 a 3 anos de detenção (não custa lembrar que a detenção é cumprida em regime semi-aberto ou aberto). O aborto provocado por terceiro é punido com reclusão: de 3 a 10 anos se não contar com o consentimento da gestante, e de 1 a 4 anos se a gestante consentir (o que ocorre na maioria dos casos).

A Constituição Federal de 1988 fala sobre certo gênero de crimes considerados hediondos:

“Art. 5º inciso XLIII – a lei considerará inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.

Este dispositivo foi regulamentado pela Lei 8072 de 25 de julho de 1990, que “dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, e determina outras providências”.

Nada mais natural que o primeiro dos crimes considerados hediondos por essa lei fosse o aborto. No entanto, o aborto não aparece na lista. Estão elencados: homicídio praticado por grupo de extermínio, homicídio qualificado, latrocínio (roubo mediante morte da vítima), extorsão qualificada pela morte, extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada, estupro, atentado violento ao pudor e epidemia com resultado morte. Em 1994 foi acrescentado o genocídio (Lei 8930 de 6 de setembro de 1994). Já se cogitou até em incluir a falsificação de remédios (!).

E o aborto? Continua sendo um crime de quinta categoria. E há no Congresso Nacional vários projetos tentando não só descriminá-lo como até obrigar o SUS a praticá-lo! Sem falar na Norma Técnica do Aborto (chamada “Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual Contra Mulheres e Adolescentes“) assinada pelo Ministro da Saúde José Serra em 9 de novembro de 1998 que, driblando o Legislativo, instruiu a rede pública hospitalar a abortar criancinhas de até cinco meses, filhas de estupradores.

Já houve quem notasse essa lacuna da lei. No dia 11 de agosto de 1998, o deputado Francisco Silva (PPB/RJ) apresentou o Projeto de Lei 4703/98 que “acrescenta o inciso VIII e o § 1º ao art. 1º da Lei n.º 8072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos”. Tal projeto pretendia considerar hediondo “qualquer forma de aborto direto, voluntário, como fim ou como meio”. Com o fim da legislatura, porém, o projeto foi arquivado definitivamente em 02/02/1999 pela Mesa Diretora.

Desta vez um deputado alagoano, Givaldo Carimbão (PSB/AL) apresentou no dia 26 de junho de 2001 um projeto quase idêntico. Trata-se do Projeto de Lei 4917/2001, que “inclui inciso no artigo primeiro da lei 8072, de 25 de julho de 1990, tipificando como hediondo o crime de aborto e altera os artigos 124, 125 e 126 do código penal brasileiro, e dá outras providências”.

Até o fechamento desta edição, não tive acesso ao texto integral do projeto. Todas as informações aqui relatadas foram extraídas da Agência Câmara de Notícias, dia 29/06/2001, “Aborto pode tornar-se crime hediondo“, por Patrícia Roedel/AM. Segundo a reportagem, “para Givaldo Carimbão, é uma incoerência as punições para os crimes de homicídio, lesão corporal seguida de morte e latrocínio serem maiores que as penas previstas para o abortamento. Ele lembra que, nos casos dos crimes citados, as penas são aumentadas quando não houve chances de defesa para a vítima, ‘como ocorre em um aborto’”.

Reconhecido como hediondo, o aborto não será suscetível de anistia, graça, indulto, fiança e liberdade provisória. A pena terá que ser cumprida integralmente em regime fechado (cf. Lei 9072/90 dos crimes hediondos, art. 2º). Sendo assim, uma conseqüência inevitável é que não poderá haver penas de detenção (regime semi-aberto ou aberto), mas tão-somente de reclusão. Assim, a pena para o aborto provocado pela própria gestante (art. 124) continua com a duração de 1 a 3 anos, mas tem a “detenção” mudada para “reclusão”. O aborto provocado por terceiro já é punido por reclusão no Código atual. No entanto, o deputado pretende aumentar a duração das penas: reclusão de 6 a 15 anos para quem provocar o aborto sem o consentimento da gestante (art. 125); e reclusão de 4 a 10 anos para quem provocar aborto com o consentimento dela (art. 126).

É verdade que as penas continuarão sendo suaves para um crime tão bárbaro, mas haverá um avanço significativo em nossa legislação penal. O melhor de tudo é que, reconhecido o aborto como crime hediondo, não será mais possível suspender o processo, como hoje habitualmente se faz, submetendo o criminoso a restrições simbólicas, tais como: proibição de freqüentar determinados lugares, proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz, comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades etc. (cf. Lei 9099/95 art.89). A pena para o aborto será cadeia de verdade! Parece até um sonho diante da impunidade reinante neste país para quem mata criancinhas…

 

Código Penal atual

Projeto de Lei 4917/2001 do deputado Givaldo Carimbão (PSB/AL)

TIPO DE ABORTO

PENA

DURAÇÃO

PENA

DURAÇÃO

art. 124 — aborto provocado pela própria gestante.

detenção

1 a 3 anos

reclusão

1 a 3 anos

art. 125 — aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante.

reclusão

3 a 10 anos

reclusão

6 a 15 anos

art. 126 — aborto provocado por terceiro, com o consentimento da gestante.

reclusão

1 a 4 anos

reclusão

4 a 10 anos

 

Anápolis, 8 de julho de 2001.

Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis

Compartilhe!

Para se inscrever é só preencher os dados abaixo e aguardar nosso email de confirmação.