(Conselho Federal de Medicina propõe legalização do aborto até três meses)
Em 12 de março de 2013, o Conselho Federal de Medicina emitiu o Ofício Circular CFM Nº 46/2013 comunicando que durante o I Encontro Nacional de Conselhos de Medicina 2013, realizado de 6 a 8 de março, em Belém (PA), deliberou-se, por maioria, apoiar a descriminalização do aborto em todos os casos propostos pelo Projeto Sarney (PLS 236/2012), inclusive por simples vontade da gestante até a 12ª semana de gestação[1]. Segundo uma frase confusa da carta, “não se decidiu serem os Conselhos de Medicina favoráveis ao aborto, mas, sim, à autonomia da mulher e do médico”. Que significa isso? Segundo Dom João Carlos Petrini, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, a mensagem é inequívoca: “Quando alguém atrapalha, pode ser eliminado. Para justificar sua posição, o CFM evoca a autonomia da mulher e do médico, ignorando completamente a criança em gestação”[2].
No ofício, assinado pelo presidente Roberto Luiz d’Avila e pelo primeiro secretário Desiré Carlos Callegari, diz-se que a deliberação foi feita por maioria e não por unanimidade. Pergunta-se: 1) todos os Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) estavam representados? 2) quantos representantes votaram contra a proposta? 3) quais foram os votos dissidentes?
Pelo menos dois CRMs já protestaram publicamente contra a decisão: o de Minas Gerais e o de Goiás. Segundo João Batista Gomes Soares, presidente do CRM-MG, “os conselheiros mineiros foram unânimes em não concordar com essa posição”[3]. Os conselheiros goianos, reunidos no dia 21 de março, decidiram também por unanimidade rejeitar o apoio ao aborto por vontade da gestante até a 12ª semana de gestação[4].
O pneumologista Edson de Oliveira Andrade, que foi presidente do CFM de 1999 até 2009, pergunta:
Quando nos ouviram sobre o assunto? Quando perguntaram aos médicos brasileiros o que eles pensam sobre o aborto? A resposta é NUNCA. Nem antes e nem agora.
Assim, o posicionamento do CFM é apenas e tão somente o posicionamento majoritário de seus membros, e NUNCA, pelo menos até que consulte aos mais de 300.000 médicos brasileiros, a nossa posição sobre o assunto. Mas infelizmente o que se lê na mídia é que esta posição é a nossa posição[5].
A jornalista Rachel Sheherazade do SBT comenta com palavras muito duras a decisão pró-aborto do CFM:
A indefensável defesa do Conselho Federal de Medicina à causa do aborto é uma contradição abominável. Médicos que deveriam resguardar a vida, agora apoiam a morte. Que vergonha! Consideram inaceitável mulheres morrerem em abortos ilegais, mas defendem a morte de crianças em abortos legais! Do alto de sua arrogância, o Conselho quer sentenciar qual vida tem mais valor. Ou será que o Conselho passou a defender o aborto de olho em um novo nicho de mercado? […] Quando médicos se sentem livres para defender o aborto e juristas nos dizem que o ninho de um pássaro vale mais que uma vida humana, podem apostar: estamos perdidos[6].
O jurista Cícero Harada destaca que o CFM, sendo autarquia federal, rege-se pelo direito administrativo, ou seja, deve observar estritamente o que a lei determina. Ora, a lei 3268/1957, ao descrever em seu artigo 5º, as atribuições do CFM, não o autoriza a apoiar ou não projetos de lei, muito menos dessa natureza:
A proposta do aborto, pois, sequer poderia ter sido posta em discussão, ser aprovada ou rejeitada, menos ainda a sua defesa encaminhada ao Senado, em nome do CFM. São atos de desvio de finalidade e como tais nulos de pleno direito e de nenhum efeito. Cuida-se de grave instrumentalização política de entidade que sempre gozou da mais ampla respeitabilidade social, mas que agora, ao arrepio da lei, embarca na canoa da morte[7].
Estatísticas
Os argumentos pró-aborto usados pelo CFM não têm nada de novo. Como de costume, afirma-se que “o abortamento é importante causa de mortalidade materna no país”. Vejamos, porém, as estatísticas do DATASUS sobre o número de mulheres que morreram em “gravidez que termina em aborto”.
Categoria CID-10 |
1996 |
1997 |
1998 |
1999 |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2004 |
2005 |
2006 |
2007 |
2008 |
2009 |
2010 |
O00 Gravidez ectopica |
34 |
26 |
23 |
30 |
27 |
25 |
22 |
36 |
29 |
39 |
30 |
40 |
31 |
44 |
42 |
O01 Mola hidatiforme |
2 |
6 |
4 |
3 |
2 |
9 |
5 |
3 |
4 |
6 |
4 |
6 |
3 |
6 |
11 |
O02 Outr produtos anormais da concepcao |
13 |
13 |
15 |
22 |
12 |
16 |
10 |
21 |
24 |
9 |
13 |
14 |
8 |
21 |
22 |
O03 Aborto espontaneo |
6 |
9 |
7 |
6 |
5 |
10 |
8 |
8 |
17 |
10 |
21 |
8 |
9 |
8 |
5 |
O04 Aborto p/razoes medicas e legais |
1 |
1 |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
1 |
O05 Outr tipos de aborto |
6 |
13 |
4 |
13 |
10 |
8 |
18 |
21 |
17 |
11 |
19 |
12 |
12 |
10 |
16 |
O06 Aborto NE |
72 |
83 |
60 |
64 |
62 |
68 |
45 |
57 |
54 |
53 |
45 |
46 |
47 |
56 |
48 |
O07 Falha de tentativa de aborto |
12 |
12 |
6 |
9 |
10 |
11 |
7 |
6 |
11 |
22 |
7 |
7 |
7 |
24 |
9 |
Total |
146 |
163 |
119 |
147 |
128 |
148 |
115 |
152 |
156 |
150 |
139 |
133 |
118 |
169 |
154 |
Fonte: MS/SVS/DASIS – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
Como se vê, o número de óbitos por ano não ultrapassa 200. Mas desse número, já pequeno, é preciso subtrair a morte por gravidez ectópica (O00), mola hidatiforme (O01), outros produtos anormais da concepção (O02) e abortos espontâneos (O03). Onde estarão as mortes de gestantes por abortos provocados? Devem estar espalhadas nas outras categorias, lembrando porém que a categoria O06 – aborto NE (não especificado) – pode conter também abortos espontâneos.
Categoria CID-10 |
1996 |
1997 |
1998 |
1999 |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2004 |
2005 |
2006 |
2007 |
2008 |
2009 |
2010 |
O04 Aborto p/razoes medicas e legais |
1 |
1 |
– |
– |
– |
1 |
– |
– |
– |
– |
– |
– |
1 |
– |
1 |
O05 Outr tipos de aborto |
6 |
13 |
4 |
13 |
10 |
8 |
18 |
21 |
17 |
11 |
19 |
12 |
12 |
10 |
16 |
O06 Aborto NE |
72 |
83 |
60 |
64 |
62 |
68 |
45 |
57 |
54 |
53 |
45 |
46 |
47 |
56 |
48 |
O07 Falha de tentativa de aborto |
12 |
12 |
6 |
9 |
10 |
11 |
7 |
6 |
11 |
22 |
7 |
7 |
7 |
24 |
9 |
Total |
91 |
109 |
70 |
86 |
82 |
88 |
70 |
84 |
82 |
86 |
71 |
65 |
67 |
90 |
74 |
Fonte: MS/SVS/DASIS – Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM
Em suma: a mortalidade anual de gestantes por abortos provocados (consumados ou tentados) costuma ficar abaixo de 100. Esse número, porém, pode ser reduzido ainda mais se o Estado, em vez de legalizar o aborto, combater a sua prática.
Um outro argumento, que não poderia faltar em um texto pró-aborto, é o relativo ao alto índice de internações hospitalares de mulheres por causa de aborto “realizado de forma insegura”. Segundo o CFM, “em 2001, houve 243 mil internações no Sistema Único de Saúde (SUS) por curetagens pós-abortamento”. Pergunta-se: por que citar dados de um ano tão distante (2001)?
Eis um quadro de estatística mais atualizada:
Período:2008-2012 |
|||||
Lista Morb CID-10 |
2008 |
2009 |
2010 |
2011 |
2012 |
15 Gravidez parto e puerpério |
218514 |
223504 |
220571 |
211476 |
207216 |
..Aborto espontâneo |
115370 |
121807 |
120194 |
112300 |
106374 |
..Aborto por razões médicas |
3285 |
1850 |
1686 |
1504 |
1626 |
..Outras gravidezes que terminam em aborto |
99859 |
99847 |
98691 |
97672 |
99216 |
Total |
218514 |
223504 |
220571 |
211476 |
207216 |
Fonte: Ministério da Saúde – Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS)
Como se vê, as internações anuais por causas relativas ao aborto somam pouco mais de 200.000, sendo que mais da metade referem-se a abortos espontâneos. O índice de internações anuais por aborto provocado pode estar bem abaixo de 100.000, uma vez que a categoria “outras gravidezes que terminam em aborto” pode também abrigar abortos espontâneos. No entanto, esse índice pode ser reduzido ainda mais se o Estado, em vez de legalizar o aborto, combater a sua prática.
Conclusão:
O aborto está para a Medicina como a morte está para a vida, como o não está para o sim. Já na era pré-cristã, os médicos proferiam o juramento de Hipócrates comprometendo-se a nunca fornecer a uma mulher alguma substância abortiva. A decisão do CFM de apoiar a descriminalização do aborto prevista no projeto de reforma do Código Penal (PLS 236/2012) e de enviar tal moção de apoio ao Senado está gerando uma justa indignação no meio médico e jurídico.
Utilize gratuitamente o Alô Senado (0800 612211) e envie sua mensagem aos membros da Comissão de Reforma do Código Penal:
Solicito a Vossa Excelência que rejeite totalmente a proposta do CFM de descriminalizar o aborto em nosso país. Os trezentos mil médicos brasileiros não foram consultados e certamente não apoiariam essa proposta infame, que contradiz a própria razão de ser da Medicina: salvar vidas.
Anápolis, 8 de abril de 2013
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis
[2] http://www.zenit.org/pt/articles/consideracoes-sobre-a-nota-do-conselho-federal-de-medicina-a-respeito-do-aborto
[3] http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,apoio-do-cfm-ao-aborto-ja-enfrenta-protestos-antes-de-chegar-ao-senado-,1011804,0.htm
[4] Cf. http://www.cremego.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=26526:cremego-e-contrario-a-liberacao-do-aborto&catid=3_ Infelizmente, apoiaram o aborto nos outros casos defendidos pelo CFM.
[7] Aborto: a incompetência do Conselho Federal de Medicina. 25/03/2013 in: http://www.catolicanet.com/?system=news&action=read&id=68088&eid=335