Na quarta-feira próxima, dia 18 de abril, deverá ser votado, em regime de urgência, um projeto que, se transformado em lei, obrigará os servidores das Delegacias de Polícia a mentir. Mentir para quê? Para matar. Matar a quem? Os criminosos? Não, os inocentes.

Trata-se do Projeto de Lei 18/2001, que acaba de chegar ao Senado. O autor dele é o deputado Professor Luizinho (PT/SP). O projeto foi aprovado às pressas na Câmara e agora, com a mesma precipitação, pretende ser votado no Senado e convertido em lei. O que pretende tal projeto?

Que os delegados de polícia mintam, informando às vítimas de estupro que a lei lhes assegura o direito de matar. Matar a quem: o estuprador? Não, a criança concebida. E o estuprador? Vai bem, obrigado. De acordo com o nosso Código Penal (art. 213) ele sofrerá no máximo 10 anos de reclusão. E isso só depois de um julgamento, com amplo direito de defesa. A criança, porém, segundo o projeto em pauta, poderá ser sumariamente exterminada.

Evidentemente tanto o deputado Professor Luizinho quanto os outros ardorosos defensores deste projeto esqueceram-se de um princípio constitucional que não pode ser violado: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado“(art. 5º – inciso XLV da Constituição Federal). Em outras palavras: a criança concebida não pode sofrer os dez anos de reclusão previstos para o seu pai. No entanto, o projeto prevê que a pena não seja apenas transferida do pai para o filho, mas aumentada: de pena de reclusão para pena de morte!

O projeto despreza sumariamente o artigo 5º (“caput”) da Constituição Federal, que assegura a inviolabilidade do direito à vida, assim como o artigo 227 (“caput”) que assegura à criança o direito à vida “com absoluta prioridade“.

Outras legislações sumariamente desprezadas pelo projeto em questão:

    • O Código Civil que em seu artigo 4º afirma :”a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro“.
    • O Estatuto da Criança e do Adolescente, que diz textualmente: “A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência” (art. 7º da Lei 8069 de 13 de julho de 1990).

Se a legislação brasileira é tão clara em proteger a criança por nascer, em que se baseia o projeto em questão para dizer que a mulher violentada tem o direito de matar o filho? Em um simples artigo do Código Penal (que aliás, não é um código de “direitos”, mas de crimes). Vejamos o art. 128 do Código, tão caro aos abortistas:

“Não se pune o aborto praticado por médico:

I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante

II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal”.

A redação é clara. Não está escrito “não constitui crime” mas tão-somente “não se pune“. O médico que pratica aborto nesses dois casos comete crime, embora esteja isento de punição. Para ilustrar isso, transcrevo um trecho de um artigo publicado pelo Juiz de Direito Marco Antônio da Silva Lemos no Correio Braziliense:

Demais disso, convém lembrar, logo de imediato, que o art. 128, CP, e seus incisos, não compõem hipóteses de descriminalização do aborto. Naquele artigo, não está afirmado que “não constitui crime” o aborto praticado por médico nas situações dos incisos I e II. O que lá está dito é que “não se pune” o aborto nas circunstâncias daqueles incisos. Portanto, em nossa legislação penal, o aborto é e continua crime, mesmo se praticado por médico para salvar a vida da gestante e em caso de estupro, a pedido da gestante ou de seu responsável legal. Apenas – o que a legislação infraconstitucional pode e deve fazer, porque a Constituição, como irradiação de grandes normas gerais, não é código e nem pode explicitar tudo – não será punido penalmente, por razões de política criminal” (MARCO ANTÔNIO SILVA LEMOS, Juiz de Direito no Distrito Federal, O alcance da PEC 25/A/95, publicado no Correio Braziliense, 18/12/1995, Caderno Direito e Justiça, página 6; os grifos são do original).

De maneira análoga, o artigo 181 de nosso Código Penal diz que não se pune o autor de crimes contra o patrimônio (entre eles o furto) praticados em prejuízo de ascendente, descendente ou cônjuge. Assim, fica isento de pena o filho que furta de seu pai. No entanto, a lei está longe de dizer que o filho tenha o “direito” de furtar de seus genitores. O furto, neste caso, continua sendo crime, embora deixe de ser punível por razões de política criminal, que os juristas chamam de escusas absolutórias. As escusas, vale a pena frisar, não tornam o ato lícito. Apenas autorizam a sua não punição.

Assim, seria estranho (para não dizer ridículo), com base nesta não punição:

– que um juiz desse autorização para um filho furtar do seu pai;

– que um legislador desejasse incluir entre os “direitos” da criança o de surrupiar coisas de seus pais;

– que fosse acrescentada ao currículo escolar uma disciplina chamada “furto legal”, onde se ensinassem as maneiras mais eficientes de furtar coisas dos pais;

– que as Delegacias da Infância e da Juventude fossem obrigadas a dar às crianças e adolescentes uma relação de escolas onde se ensinasse o “furto legal”.

Todos esses absurdos aconteceriam se os legisladores confundissem “furto não punível” com “furto legal”. Ora, não existe “furto legal”, embora haja certos furtos que não sejam puníveis, sem deixar contudo de serem crimes.

O Projeto de Lei 18/2001 “dispõe sobre a obrigatoriedade de os servidores das Delegacias de Polícia informarem às vítimas de estupro sobre o direito de aborto legal (sic)”. Obviamente não existe aborto legal no Brasil e nenhuma lei pode obrigar alguém a informar um direito que não existe. No caso da gravidez resultante de estupro, existe uma suspensão da pena após o fato consumado, mas não um permissão prévia para abortar. Assim, se for convertido em lei, o projeto obrigará os delegados de polícia a mentir.

E se o delegado não quiser mentir? E se ele, por questão de consciência, for contrário à morte de um inocente? Sua liberdade de consciência, assegurada pela Constituição Federal (art. 5º – inciso VI) será violada.

Há ainda um agravante para o caso em questão. Se aprovado, o projeto tornar-se-á lei. Ora, toda lei é pública. Tal lei induzirá publicamente à prática do aborto. Que é o aborto? Um crime. Punível ou não, é sempre crime. E o que diz nosso Código Penal sobre a incitação ao crime?

Art. 286 – Incitar, publicamente à prática de crime:

Pena – detenção, de 3 (três) a 6 (seis) meses, ou multa.

Pelo acima exposto, vê-se como o projeto está repleto de inconstitucionalidade. O simples bom senso seria suficiente para rejeitá-lo.

No entanto, já houve e ainda há, pelos Estados brasileiros, vários projetos de lei de idêntico teor. Um deles, de autoria do próprio Professor Luizinho, quando deputado estadual de São Paulo, foi aprovado e tornou-se lei, sancionada em 07/04/1999 pelo então governador Mário Covas. Antes disso, uma outra deputada estadual petista do Rio de Janeiro, Alice Tamborindeguy, havia obtido que o então governador Marcello Alencar sancionasse a lei 2802/97, de idêntico teor. Porém, a Associação de Delegados de Polícia do Estado do Rio de Janeiro (ADEPOL-RJ) entrou com uma representação por inconstitucionalidade, que foi acolhida por unanimidade pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em 22/03/1999.

Apesar de inconstitucional (ou talvez por isso mesmo) a pressa por aprovar o Projeto 18/2001 é grande. No dia 4 deste mês, a senadora Emília Fernandes (Bloco PDT/RS) apresentou um requerimento de urgência para o projeto recém-chegado ao Senado. O requerimento foi aprovado. O presidente da sessão senador Jader Barbalho advertiu que, apesar da urgência, o projeto deveria ser apreciado pelo menos por uma Comissão Técnica antes de chegar ao plenário. O projeto foi enviado então, no dia 5, para a Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Foi nomeada como relatora a senadora Heloísa Helena (PT/AL). Como a matéria encontra-se em regime de urgência, constará da pauta do dia 18 deste mês, quarta-feira da oitava da Páscoa.

Deus se compadeça de nós.

Anápolis, 12 de abril de 2001

Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anapolis

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