O atual Código Penal, com propriedade, não especifica o crime da eutanásia. O médico que mata seu doente alegando “compaixão” (!) comete crime de homicídio simples, tipificado no artigo 121, com pena de 6 a 20 anos de reclusão. Realmente não há motivo algum de distinguir a eutanásia de um homicídio simples, a não ser talvez, para aumentar a pena do criminoso. Sim, pois um doente requer, mais que alguém sadio, assistência à sua vida. Matar um doente poderia, assim, ser uma forma qualificada de homicídio, com pena maior, como as listadas no artigo 121 §2º, com pena de 12 a 30 anos de reclusão.
O que ocorreu no Anteprojeto do Código Penal elaborado pela Comissão de “Alto Nível” nomeada pelo Ministro Íris Rezende foi exatamente o contrário. Distinguiu-se a eutanásia de um homicídio simples, não para aumentar, mas para diminuir sua pena. E a diminuição foi grande: reclusão de três a seis anos. O máximo para a pena da eutanásia (6 anos) passa a ser exatamente o mínimo para a pena do homicídio simples!
A redação do parágrafo que se refere à eutanásia leva o leitor a ter uma grande simpatia pelo criminoso, quase absolvendo-o do crime. Leiamos:
Art. 121 §3º – Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima, imputável e maior, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave:
Pena – Reclusão de três a seis anos.
O artigo ainda usa a palavra “crime” referindo-se à eutanásia, mas suaviza-a de várias formas. O criminoso não é tão culpado, pois agiu por “compaixão”. Além disso foi o doente quem pediu que ele o matasse. A intenção foi “boa”: abreviar um sofrimento físico insuportável. E há ainda uma boa “razão”: a gravidade da doença.
Vê-se como a nova redação prepara psicologicamente o país para a legalização da eutanásia, em perfeita harmonia com a legalização do aborto eugênico, colocado no inciso III do artigo 128, e para gáudio dos adeptos do nazismo.
O parágrafo 4º do artigo 121 do Anteprojeto traz um caso de exclusão de ilicitude:
“Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão.“
É lamentável que o amásio ou concubino (aqui referido com o eufemismo de “companheiro”) pareça ter o mesmo “status” que os membros da família legitimamente constituída. Abstraindo disto, que diz a Igreja sobre o caso?
“Quando a morte se anuncia iminente e inevitável, pode-se em consciência ‘renunciar a tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem contudo interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes’. (…) A renúncia a meios extraordinários ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à eutanásia; exprime, antes, a aceitação da condição humana defronte à morte” (SS. João Paulo II, Encíclica Evangelium Vitae, n.º 65; os grifos são meus).
Seria conveniente acrescentar um parágrafo após o 4º (renumerando-se os demais), com a seguinte observação:
§ 5º – A exclusão de ilicitude a que se refere o parágrafo anterior não se aplica se houve omissão de meios terapêuticos ordinários ou dos cuidados normais devidos a um doente, com o fim de causar-lhe a morte.
Isto evitaria que o § 4º fosse utilizado para ocultar verdadeiros atos de eutanásia, como a negação de remédios comuns a um doente incurável.
Sugestões como esta devem ser encaminhadas ao Ministério da Justiça – Secretaria Executiva, 3º andar do Edifício Sede, sala 300, Brasília – DF, CEP: 70064-900 ou via Internet (http://www.mj.gov.br E-mail:codigopenal@mj.gov.br).
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
1º de abril de 1998