(uma ameaça maior que a de perdermos a Amazônia…)
A gravidade do caso é tão urgente, quanto mais inofensivo ele parece. Está em apreciação pelo Congresso Nacional o texto do Protocolo Facultativo à CEDAW.
Que é CEDAW? É uma sigla inglesa para a “Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher” (Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women). Tal Convenção foi aprovada em 18 de dezembro de 1979 pela Assembléia Geral das Nações Unidas e entrou em vigor em 3 de setembro de 1981. É considerada uma espécie de “carta de direitos” das mulheres. Até maio de 2001 a CEDAW tinha 168 Estados Partes. Curiosamente, os EUA não assinaram a Convenção.
A CEDAW foi assinada pelo Brasil, com reservas, em 31.03.1981 e ratificada, com reservas, em 01.02.1984. Entrou em vigor em nosso país em 02.03.1984. Em 22.06.1994 foi ratificada, sem reservas.
O texto da CEDAW não é bom, mas também não é dos piores. Quem lê-lo à procura de uma apologia do aborto e do lesbianismo, certamente ficará decepcionado. Nada é falado sobre esses temas. A Convenção também não defende o direito da mulher à prostituição. Ao contrário, “a exploração da prostituição da mulher” é explicitamente condenada no artigo 6º:
“Os Estados-Partes tomarão todas as medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para suprimir todas as formas de tráfico de mulheres e exploração da prostituição da mulher”.
Onde está, então, o enorme ameaça à soberania nacional, à qual me referi no início desta matéria? É que, segundo o artigo 17, compete a um “Comitê” de peritos “examinar os progressos alcançados na aplicação desta Convenção“. Segundo o artigo 18, a cada quatro anos os Estados Partes devem apresentar um relatório ao Comitê sobre as medidas adotadas na aplicação da Convenção e os resultados obtidos. Por enquanto, de acordo com o art. 21, o Comitê, de posse de tais relatórios, “poderá apresentar sugestões e recomendações de caráter geral“. Nada, portanto, que represente uma intervenção direta na soberania dos Estados.
Mesmo com poderes limitados, o “Comitê” tem praticado consideráveis abusos, em nome da “não discriminação da mulher”. Eis alguns exemplos:
a). Embora o aborto não apareça no texto da Convenção, o Comitê o defende abertamente: recomendou ao Burundi que legalizasse o aborto; recomendou ao Chile a legalização do aborto terapêutico; criticou a Irlanda pela influência da Igreja Católica nas políticas públicas; criticou a Itália por permitir, na realização de abortos, a objeção de consciência aos médicos por motivos religiosos; recomendou à Líbia que interpretasse o Alcorão de modo a permitir o aborto…
b). Para o referido Comitê a maternidade não é uma glória, mas uma vergonha para a mulher. Assim, criticou a Bielo-Rússia por instituir o “Dia das Mães”, já que ser mãe, para o Comitê, é um estereótipo negativo para as mulheres!
c). Em nome da eliminação da discriminação contra a mulher, o Comitê recomendou ao Quirguistão a legalização do lesbianismo, coisa que não aparece no texto da Convenção.
d). Mais ainda: o Comitê ousou recomendar o que a Convenção proibiu expressamente. Recomendou à China a legalização da prostituição, quando a Convenção é expressamente contrária a ela (art. 6°)!
Que é o Protocolo Facultativo?
Para aumentar os poderes do Comitê, a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou em 6 de outubro de 1999 um “Protocolo Facultativo” a essa Convenção. O governo brasileiro assinou tal Protocolo no dia 13 de março de 2001, na sede das Nações Unidas, em Nova York. Falta ainda ser ratificado pelo Congresso Nacional.
Se ratificarem o Protocolo Facultativo à CEDAW, os parlamentares reconhecerão a competência do Comitê para “receber e considerar comunicações… apresentadas por indivíduos ou grupos de indivíduos… que aleguem ser vítimas de violação de quaisquer dos direitos estabelecidos na Convenção” (cf. art. 1º e 2º do Protocolo Facultativo).
Assim, se uma mulher grávida de um bebê doente desejar abortar, e tal direito lhe for negado pela legislação brasileira, ela poderá, mediante qualquer grupo feminista, alegar que está sendo “discriminada” e denunciar o país diante do Comitê. Então, antes mesmo do exame do mérito da questão, “o Comitê poderá transmitir ao Estado Parte em questão, para urgente consideração, solicitação no sentido de que o Estado Parte tome as medidas antecipatórias necessárias para evitar possíveis danos irreparáveis à vítima ou vítimas da alegada violação” (art. 5º do Protocolo Facultativo). Em outras palavras, o Comitê pressionará o governo brasileiro a permitir o aborto imediatamente, a fim de que a gestante não sofra com a continuidade da gravidez (o sofrimento da criança não virá ao caso, é claro).
E se o Brasil não consentir na morte do inocente? “Dentro de seis meses, o Estado Parte que receber a comunicação apresentará ao Comitê explicações ou declarações por escrito esclarecendo o assunto e o remédio, se houver, que possa ter sido aplicado pelo Estado Parte.” ( art. 6º §2º do Protocolo Facultativo).
E se o Comitê não gostar de o Brasil ter proibido a gestante de matar o próprio filho? “O Comitê poderá convidar o Estado Parte a apresentar informações adicionais sobre quaisquer medidas que o Estado Parte tenha tomado em resposta às opiniões e recomendações do Comitê” (cf. art. 7º §5º do Protocolo Facultativo).
Se o Brasil se obstinar em proibir abortos — o que significará para o Comitê “graves ou sistemáticas violações por um Estado Parte dos direitos estabelecidos na Convenção” (art. 8º §1º do Protocolo Facultativo) — “o Comitê convidará o Estado Parte a cooperar no exame da informação e, para esse fim, a apresentar observações quanto à informação em questão” (idem). Mais ainda: “o Comitê poderá designar um ou mais de seus membros para conduzir uma investigação e apresentar relatório urgentemente ao Comitê. Sempre que justificado, e com o consentimento do Estado Parte, a investigação poderá incluir visita ao território deste último” (art. 8º §2º do Protocolo Facultativo).
E depois de tal investigação? “Após examinar os resultados da investigação, o Comitê os transmitirá ao Estado Parte em questão juntamente com quaisquer comentários e recomendações” (art. 8º §3º do Protocolo Facultativo). Obviamente, o “comentário” será um lamento pela proibição sistemática da matança dos inocentes e a “recomendação” será a de que se legalize o aborto o quanto antes. O Brasil, então, “deverá, dentro de seis meses do recebimento dos resultados, comentários e recomendações do Comitê, apresentar suas observações ao Comitê” (cf. art. 8º §4º). E depois dos seis meses? “O Comitê poderá, caso necessário, após o término do período de seis meses (…), convidar o Estado Parte a informá-lo das medidas tomadas em resposta à mencionada investigação.“(art. 9º §2º).
Ai do Brasil se vier a punir a gestante que, depois da denúncia ao Comitê, cometer o crime do aborto! A esta será assegurada toda proteção: “Os Estados Partes devem tomar todas as medidas apropriadas para assegurar que os indivíduos sob sua jurisdição não fiquem sujeitos a maus tratos ou intimidação como conseqüência de sua comunicação com o Comitê nos termos do presente Protocolo” (art. 11).
Com se vê, a ratificação do Protocolo dará ao Comitê um enorme poder sobre os Estados Partes. Ele poderá receber denúncias, realizar inquisições (inclusive do território dos países acusados), fazer recomendações e exigir respostas ao cumprimento destas. O Brasil se verá obrigado a cumprir, não apenas o texto estabelecido na Convenção (CEDAW), mas o que decidir o plenipotenciário Comitê em nome da Convenção.
E a soberania nacional? Vai mal, obrigado. Ao ratificar levianamente o Protocolo, o Congresso Nacional permitirá uma enorme ingerência externa sobre assuntos internos. Se há verdadeiras discriminações injustas contra a mulher em nosso país, cabe aos nossos legítimos representantes eliminá-las. Não precisamos de um órgão externo que nos fiscalize, pressione ou ameace. Basta a grande pressão que organismos internacionais como a UNIFEM e o FNUAP exercem sobre o nosso governo, financiando grupos feministas, como o CFEMEA, que monitora a tramitação de todos os projetos de lei abortistas.
Em silêncio e com pressa
No dia 26 de abril de 2001, o Executivo Federal enviou ao Congresso Nacional a Mensagem 374/2001 para ratificar ou rejeitar o Protocolo. No dia 03 de outubro, a Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional aprovou a Mensagem. No dia 17 de outubro de 2001, a mesma Comissão apresentou em plenário a mensagem sob a forma de um Projeto de Decreto Legislativo, o PDC-1357/2001. No dia 18 de outubro 2001, a Mensagem foi encaminhada à Coordenação de Comissões Permanentes.
O jornal feminista Fêmea (do CFEMEA) na edição de outubro de 2001, p.4, dizia: “Em audiência realizada com o movimento de mulheres e deputadas, o presidente da Câmara dos Deputados, deputado Aécio Neves (PSDB/MG) comprometeu-se a aprovar requerimento de urgência e levar a mensagem o mais rápido possível ao Plenário“. De fato, no dia 22 de novembro de 2001, os líderes das bancadas apresentaram em plenário um requerimento solicitando que o Projeto tramitasse em regime de urgência. No dia 6 de dezembro de 2001 o requerimento foi aprovado. No dia 12 de dezembro de 2001, o Projeto foi às pressas discutido em turno único, votado, aprovado e encaminhado ao Senado Federal (PDC 1357-B/01), onde recebeu o nome PDS 00001/2002.
Embora haja, em países vizinhos como a Argentina, um forte movimento contra a aprovação do Protocolo Facultativo, no Brasil ele vem tramitando em silêncio, quase sem sofrer protestos e com grande velocidade. As feministas brasileiras estão otimistas. Ainda que reconheçam a dificuldade de tramitação de projetos em um ano eleitoral, elas esperam pelo menos garantir a aprovação do Protocolo no Senado Federal (cf. Jornal Fêmea, jan. 2002, p. 4).
Que fazer?
Nossa última chance é barrar o Projeto no Senado. Praza a Deus que o assunto mereça algum espaço na 40ª Assembléia Geral da CNBB, a realizar-se em Itaici, de 10/04/2002 a 19/04/2002.
De nossa parte, podemos rezar e encaminhar mensagens aos senadores solicitando a NÃO APROVAÇÃO do PDS 00001/2002 de 05/02/2002.
Anápolis, 31 de março de 2002
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Presidente do Pró-Vida de Anápolis