(Fabiana conta sua história e a de Vítor, concebido em um estupro)
Quando Vítor foi concebido, em meados de agosto de 1999, sua mãe, Fabiana Silva, era uma adolescente de 14 anos, moradora da periferia de Goiânia. Havia concebido o menino em um estupro praticado pelo padrasto. Se o autor do estupro fosse apanhado, sofreria no máximo 10 anos de reclusão (art. 213, CP). E isso só depois de um julgamento com amplo direito de defesa.
Vítor, porém, sem a menor culpa, já estava condenado à morte por causa do crime de seu pai. Em dezembro de 1999, Fabiana estava disposta a abortar Vítor de qualquer jeito. A criança na época já estava com 4 meses e os médicos do Hospital Materno Infantil de Goiânia hesitavam em matá-la. Restava uma última esperança: o Hospital Municipal Dr. Arthur Ribeiro de Saboya, na capital paulista, conhecido como Hospital de Jabaquara, que desde 1989, sob o comando do médico Dr. Jorge Andalaft, especializara-se em abortar bebês concebidos em um estupro. Na época, o Hospital fazia em média, um a dois abortos por mês.
Não foi fácil a batalha para salvar a vida de Vítor. Visitamos várias vezes a casa de Fabiana, conversamos com ela e sua mãe Ana Francisca da Silva, exibimos o vídeo “A dura realidade”, mostrando cenas de abortos praticados nos Estados Unidos… No dia 1º de janeiro de 2000, levamos a jovem Alcineide ( 22 anos, vítima de estupro) com seu filho David (12 anos, concebido no estupro) para conversar com Fabiana. As duas conversaram muito, choraram… Alcineide implorou que Fabiana lutasse até o fim pelo seu filho, assim como ela lutara por David.
Ao mesmo tempo que tentávamos convencer Fabiana a assumir com amor a própria maternidade e lhe oferecíamos toda a assistência possível durante a gestação, parto e puerpério, passamos a combater em outra frente: convocamos pessoas do Brasil e do mundo para que suplicassem ao Dr. Jorge Andalaft que poupasse a vida do inocente. Graças a Deus, a mobilização mundial foi surpreendente.
Quando no dia 4 de janeiro de 2000, às 16 horas, telefonei para o Hospital de Jabaquara, tive a honra de conversar pessoalmente com Dr. Andalaft. Ele se demonstrou extremamente irritado por estar recebendo protestos de todas as partes do mundo e por todos os meios: telefone, fax, correio eletrônico. Informou que recebia em média 30 telefonemas por hora! Indignado, ameaçou processar-me por “invasão de privacidade” (sic!). Perguntei se ele havia recebido ofensas, e ele prontamente respondeu: “Sim. Estão-me chamando de assassino, de aborteiro, dizendo que eu vou matar a criança…”. Nessa hora eu apartei: “O senhor não vai matar a criança? Se não vai, diga-me, que eu espalharei agora mesmo a notícia”. O doutor ficou perturbado e não soube dar resposta. Ele só tinha até o dia seguinte para responder se faria ou não o aborto.
Levado pela emoção, prosseguiu: “Aposto que vocês, que tentam impedir o aborto, depois de seis meses deixarão a menina sozinha, abandonada, sem poder continuar os estudos e convivendo com o fruto de sua violência”. Graças a Deus, Dr. Andalaft foi um péssimo adivinho.
No dia seguinte, 5 de janeiro de 2000, à noite, ele finalmente informou que o Hospital de Jabaquara não iria fazer o aborto em Fabiana. O menino tinha então cerca de 5 meses de vida. No dia 6, Fabiana e sua mãe já haviam desistido totalmente da ideia do aborto. A gravidez transcorreu maravilhosamente bem. Não faltou quem oferecesse toda sorte de assistência a Fabiana e sua mãe, inclusive o pagamento do aluguel de uma nova casa, mais próxima da escola onde a adolescente cursava a 2ª série do ensino médio.
Na segunda-feira, dia 15 de maio de 2000, às 19h 55min, no Hospital Materno Infantil de Goiânia, nasceu Vítor, 52 cm, 3.115 g, de parto normal. Cerca de vinte médicos acompanharam o nascimento do bebê mundialmente famoso.
Para decepção de Dr. Jorge Andalaft, Vítor foi um verdadeiro presente para Fabiana e sua família. Antes decidida a abortá-lo, depois de dá-lo à luz, Fabiana apaixonou-se pelo bebê. No dia 17 de junho de 2000, na Catedral Bom Jesus, Anápolis, Vítor era batizado e Fabiana, com 15 anos, fazia sua Primeira Comunhão.
Os estudos de Fabiana transcorreram normalmente e a situação da família melhorou muito depois que o bebê nasceu. Deus nunca permitiu que lhes faltassem benfeitores, seja para a compra de gêneros alimentícios, seja para o aluguel da casa.
Dezoito anos depois…
Em 24 de outubro de 2018, Fabiana Silva, agora com 34 anos, veio visitar a nova sede do Pró-Vida de Anápolis a fim de manifestar sua gratidão. Na ocasião, aceitou gravar um vídeo cuja transcrição vai a seguir:
Aos quatorze anos de idade eu fui vítima de violência sexual cometida pelo meu padrasto. E em decorrência desse abuso, eu fiquei grávida. E essa gravidez, na época, para mim, foi motivo de muito transtorno. Eu [era] muito jovem, praticamente uma criança… o que é que vinha na minha cabeça? “Quero abortar! Por que eu quero abortar? Eu sou uma criança! Que é que eu vou fazer? Vou colocar mais uma criança no mundo para poder sofrer?” Assim era a maneira como eu pensava.
No decorrer dessa gestação, com a ideia fixa de aborto – queria porque queria fazer –, foi quando eu conheci o Pró-Vida. Ou o Pró-Vida me encontrou [risos], melhor dizendo. Foi tão interessante, porque nos nossos primeiros encontros, eu me lembro que eu [era] muito dura, um coração muito duro, diante de algumas filmagens, vídeos que eles levaram para que eu pudesse ver a maneira como acontecia o aborto. Eu lembro que aquilo eu olhava assim de uma maneira tão indiferente… Só que o tempo foi passando. O tempo foi passando e eles não desistiram de mim.
E hoje assim eu quero dizer que eu sou muito grata. Muito grata ao Pró-Vida, muito grata a quem esteve, com eles, naquele momento [chorando]… porque hoje palavras seriam muito pouco para descrever o que eu sinto. Porque eu desisti da ideia de fazer o aborto, o Vítor nasceu, o Vítor hoje tem dezoito anos de idade… E o primeiro momento, quando eu tive o meu filho nos meus braços… é um amor incondicional, um amor que vem do próprio Deus. Sabe, não tem como explicar. Como eu ouvi – é algo muito lindo, que me marcou muito – que Deus põe anjos nas nossas vidas da maneira mais inesperada. E o Vítor foi um anjo que Deus colocou na minha vida. Sabe, olhar para o meu filho, saber que ele teve a oportunidade de hoje estar aqui, de hoje estar do meu lado, é o meu amigo, é meu companheiro, é um menino lindo, que me dá muito orgulho…
É tão interessante, porque a ideia em si de aborto… Como que eu tive coragem de pensar? A gente se perdoa porque [era] muito criança ainda, mas… aborto não! Aborto, não! Sacrificar uma vida totalmente indefesa, totalmente dependente de você, não tem para onde fugir, não tem para onde escapar… Hoje eu penso assim: seria muita covardia fazer isso… [chorando].
Dezoito anos se passaram. E eu estou aqui, firme e forte, para falar que não! Que eu sou contra o aborto sim! Eu sou a favor da vida! Fui violentada? Fui. Uma criança, aos quatorze anos de idade! Mas eu estou aqui para falar! Foi difícil? Foi. Mas eu venci! Eu continuei meus estudos, eu concluí o ensino médio, eu fiz faculdade. Meu filho serviu de inspiração. Toda vez que eu pensava em desistir de algo, desistir dos meus sonhos, eu olhava para ele e falava: “Nossa! Eu não posso. Eu preciso lutar não só por mim, mas por ele também”. Meu filho era o gás que eu precisava, era a motivação que eu precisava. Sabe, quando eu olhava para ele, então aquilo me dava forças. Não era mais só eu. Tinha alguém ali que dependia de mim também [sorrindo e depois chorando].
– Fabiana, o que você acha de oferecer o aborto para as vítimas de violência sexual?
Eu não concordo. Eu não concordo porque já basta o trauma que a gente passa pela violência física, pela violência psicológica. Tirar, abortar a criança eu acredito que só vai trazer mais transtornos. Falo porque eu vivi. Eu estive lá dentro e convivi com pessoas que fizeram, que consumaram o aborto. De fato, a culpa que a pessoa sente depois, pelo menos das pessoas que eu pude acompanhar, eu pude estar perto… Eu falo porque eu fiquei cinco anos em terapia, participei de grupos e grupos… de pessoas que estavam ali também buscando o mesmo tipo de ajuda […] Só que o aborto não vai resolver. O aborto não vai resolver. Não quer? Doa! Doa a criança. Coloca à disposição! Hoje a gente tem um serviço social que tem todo o preparo para encaminhar, para poder fazer isso. Ah, mas… matar não! Nós não temos o direito. Nós não temos o direito de ceifar uma vida. A gente até costuma brincar: é fácil para a gente falar, porque a gente já nasceu. É muito fácil. Mas, e aí? Hoje eu vejo grupos militantes de feministas levantando bandeira: “Aborto sim, aborto sim!” … É fácil falar: a gente já nasceu.
Anápolis, 12 de novembro de 2018.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz.
Presidente do Pró-Vida de Anápolis.