(condição para que o aborto não entre no Brasil)
Aquele que combate o aborto – o mais cruel de todos os homicídios – tem o dever de não ser homicida. No Sermão da Montanha, o Senhor Jesus, que veio não para abolir a Lei, mas para dar-lhe pleno cumprimento (Mt 5,17), ensinou que o mandamento “Não matarás” proíbe não apenas que eliminemos a vida física de alguém, mas também que nos irritemos contra o irmão.
Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não matarás; aquele que matar terá de responder no tribunal. Eu, porém, vos digo: todo aquele que se encolerizar contra seu irmão terá de responder no tribunal; aquele que chamar ao seu irmão ‘Cretino!’ estará sujeito ao julgamento do Sinédrio; aquele que lhe chamar ‘Louco!’ terá de responder na geena do fogo (Mt 5,21-22).
Dizer, portanto, ao próximo uma palavra humilhante, com a intenção de feri-lo, é um pecado contra o quinto mandamento. É um homicídio praticado com a língua. Os contemporâneos de Jeremias usavam da língua para ferir o profeta:
Vinde! Maquinemos planos contra Jeremias […]. Vinde! Firamo-lo com a língua e não atendamos a nenhuma de suas palavras (Jr 18,18).
Porém, como “a boca fala daquilo de que o coração está cheio” (Mt 12,34), todo homicídio vem do coração.
O que sai do homem, é isso que o torna impuro. Com efeito, é de dentro do coração do homem que saem as intenções malignas: prostituições, roubos, assassínios… (Mc 7,20-21).
Odiar o irmão já é cometer um homicídio:
Nós sabemos que passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Aquele que não ama permanece na morte.
Todo aquele que odeia o seu irmão é homicida; e sabeis que nenhum homicida tem a vida eterna permanecendo nele (1Jo 3,14-15).
O homicídio que começa no coração e se externa nas palavras é muito mais sutil que o homicídio cruento. Facilmente podemos cometê-lo, muitas vezes com “boas intenções”, das quais, como diz o provérbio, o inferno está cheio. Falo mal do próximo porque “eu estou com a razão”, porque “ele merece”, porque “preciso extravasar minha indignação”, porque “não posso deixar de desabafar o que sinto” … Poucas pessoas enxergam esse pecado. Por isso, poucas se arrependem dele e poucas se emendam. O resultado é uma cegueira contínua:
Aquele que diz que está na luz, mas odeia o seu irmão, está nas trevas até agora. O que ama o seu irmão permanece na luz, e nele não há ocasião de queda. Mas o que odeia o seu irmão está nas trevas; caminha nas trevas, e não sabe aonde vai, porque as trevas cegaram os seus olhos (1Jo 2,9-11).
Santa Teresa de Calcutá, intrépida adversária do aborto, não dava lugar ao homicídio por palavras. Diz seu biógrafo Pe. Leo Maasburg que ela “por princípio, nunca proferia palavra negativa acerca de ninguém”. Interrogada sobre o seu silêncio quanto a fatos negativos de outras pessoas, incluindo as autoridades soviéticas e os funcionários de Calcutá, Madre Teresa dizia: “Sabe, padre, é melhor desculpar do que acusar”. E ainda: “Quando condenamos uma pessoa, ficamos sem tempo para amá-la”[1]. E mais: “Um pecado que nunca terei de confessar é o de ter condenado alguém”[2]
Em vez de colocar o centro do problema nos outros, ela o colocava em si própria. Dizia: “Se eu pudesse mudar alguma coisa na Igreja, eu mudaria a mim mesma”. Percebe-se que Madre Teresa entendia bem a doutrina da comunhão dos santos, tão bem expressa nesta frase da Serva de Deus Élisabeth Leseur: “Uma alma que se eleva eleva o mundo”.
O jejum que agrada a Deus
No intervalo entre o primeiro e o segundo turno das eleições presidenciais de 2022, fizemos um jejum implorando a Deus que a tragédia de um novo governo petista não se consumasse. No entanto, o candidato do PT venceu. Qual terá sido o motivo? Talvez nós o encontremos no capítulo 58 do profeta Isaías:
Por que temos jejuado e tu não vês? Temos mortificado nossas almas e não tomas conhecimento disso? (Is 58,3).
O Senhor responde:
A razão está em que jejuais para entregar-vos a contendas e rixas, para ferirdes com punho perverso. Não continueis a jejuar como agora, se quereis que a vossa voz seja ouvida nas alturas! (Is 58,4).
Ao contrário,
se afastares do meio de ti o jugo, o gesto ameaçador e a linguagem iníqua […] a tua luz brilhará nas trevas, e a escuridão será para ti como a claridade do meio dia” (Is 58,9-10).
Agora que a situação nacional parece mais grave do que nunca, com a Ministra Rosa Weber prestes a pôr em pauta a ADPF 442 (liberação do aborto até 12 semanas), convém que entendamos que da nossa conversão pessoal depende a conversão do Brasil.
É hora de deixarmos a mentira (cujo pai é o demônio), a avareza (que é uma idolatria), o orgulho, a vaidade, mas sobretudo o homicídio. É hora de fazermos um bom exame de consciência e de nos assustarmos com o número e a gravidade dos homicídios por nós cometidos.
Sem nos deixarmos levar pelo desespero, é hora de procurarmos a misericórdia de Deus por meio da confissão e da absolvição sacerdotal. É hora de deixarmos no confessionário o homem velho e sairmos renovados para a luta em defesa da vida.
Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Vice-presidente do Pró-Vida de Anápolis.
[1] Leo MAASBURG. Madre Teresa: uma vida maravilhosa. São Paulo: Paulinas, 2015, p. 108
[2] Ibidem, p. 110